sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

PARA REFLECTIR A PROPÓSITO DE ...ARGUMENTAÇÃO, VERDADE E SER.

Como é possível entrever na polémica travada por Platão contra os sofistas, o problema da verdade é um dos mais complexos da filosofia. No texto que se segue, Roger Mucchielli coloca precisamente esta questão...


"O problema da verdade liga-se intimamente ao problema do conhecimento. Pode dizer-se que a verdade é o valor absoluto de uma ideia ou de uma relação perfeitamente intelígivel e demonstrada. Proceder assim é pôr a verdade "acima da experiência", no mundo do pensamento, como propõe o racionalismo. Pode também dizer-se que a verdade é a própria experiência, o concreto, o mundo das percepções - assim procede o empirismo; ou ainda que a verdade é uma exigência do espírito humano, como afirma o idealismo.Seguiremos outra via de apresentação e mostraremos que a compreensão da noção de verdade passa da objectividade à subjectividade, do mundo ao homem, do facto ao ideal. Havérá uma verdade? Todos os que colocam esta questão e a resolvem pela negativa ou pela dúvida retomam forçosamente os argumentos dos cépticos gregos (...). "O homem é a medida de todas as coisas", dizia Protágoras, e esta fórmula tornou-se a divisa de todos os antidogmatismos, isto é, de todos os esforços para conduzir as verdades ditas eternas ou absolutas a pequenas verdades, tão relativas ao modo humano de viver e compreender, relativas à época, ao carácter, às influências, que até já nem parecem verdades. Nós dizemos muitas vezes que gostos e cores não se discutem, que tudo contém uma parcela da verdade, que tudo depende do ponto de vista, que a verdadade para cá dos Pirinéus é o erro do lado de lá, como dizia Pascal, e que é preciso, como Montaigne, fazer orelhas moucas; Que sei eu?, deixamos de procurar a verdade sempre caduca, sujeita a caução, ou fonte de tormentos; contentemo-nos de bom grado e em vez disso, com certo jogo de boas pequenas verdades práticas, as que são eficazes e que permitem, a propósito das grandes questões, uma tolerância verdeiramente respeitável.Há uma verdade? É difícil responder a isto, se nos colocarmos no plano dos factos e, sobretudo, se aceitarmos que a verdade é alguma coisa que se poderia encontrar o ouro na areia ou o caroço num fruto. Nunca poderemos ter uma verdade deste tipo.(...) Com efeito, aquele que crê possuir a verdade como algo de indubitável é um ser perigoso: tem tendência para exigir do outro a conversão ou a morte, depressa se torna intolerante ou fanático. Ora, nós sentimos de uma forma irre´sistível, e a história confirma, que o fanatismo tam como o dogmatismo, são mestres em erros e crimes.
Roger Mucchielli, Philosophie de la connaissance

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Estudos e experiências em Psicologia

Quando estudamos a Psicologia tomamos conhecimento de um conjunto variado de estudos e experiências que nos elucidam sobre aspectos centrais do nosso comportamento e funcionamento mental. Obviamente que nem todas as experiências realizadas em Psicologia são estudadas na escola. Das inúmeras que ficam de fora, algumas podem ser classificadas como "esquisitas". Daí que um blogue especializado em Psicologia se tenha lembrado de apresentar e de colocar à votação os dez estudos mais esquisitos em Psicologia (disponível apenas em inglês).

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

A irrelevância da Filosofia

A irrelevância da filosofia
Jornal Público
15.01.2008, Desidério Murcho

A filosofia é irrelevante, num certo sentido. No sentido psicológico em que a generalidade das pessoas se está nas tintas para o escrutínio cuidadoso das suas convicções. Mas, nesse sentido psicológico, quase tudo é irrelevante para quase toda a gente: quase ninguém no mundo tem paciência para aprender a dirigir uma orquestra, ou para saber física quântica, ou para conduzir táxis ou para fazer pão.
Os filósofos ocupam-se do estudo cuidadoso das nossas convicções e crenças mais básicas. Tão básicas que, por vezes, não temos sequer consciência de que as temos: apenas agimos aceitando-as como pressupostos óbvios. Eis alguns exemplos: pensamos que o mundo não foi criado há dez minutos, com todos os falsos indícios para nos fazer pensar o contrário; pensamos que as outras pessoas têm uma interioridade como a nossa, não sendo meros autómatos; pensamos que o que acontece no passado é um bom guia para o que acontece no futuro, e que, por isso, a água que ontem nos saciou a sede hoje não vai envenenar-nos.
Os filósofos ocupam-se, em grande parte, do estudo destas convicções profundas. E um dos aspectos que mais nos interessam é a justificação. Sem dúvida que a justificação é irrelevante para a generalidade das pessoas. As pessoas não acreditam em todas aquelas coisas por haver ou deixar de haver boas justificações para elas. Mas, para os filósofos, é irrelevante que para a generalidade das pessoas as justificações sejam irrelevantes. Para o maestro, também é irrelevante que para a maior parte das pessoas saber dirigir uma orquestra seja irrelevante. Não é irrelevante para o maestro.
Pensa-se por vezes que a filosofia serve apenas para pôr uma cereja de erudição e autoridade em cima do bolo das nossas convicções mais queridas. Mas isto é perverter a filosofia. A atitude filosófica por excelência é a atitude socrática de examinar a nossa vida, pois "uma vida não examinada não vale a pena ser vivida", como Platão (427-347 a.C.) escreveu na Apologia, p. 38a. Este trabalho filosófico é irritante, incómodo, irrelevante? Talvez. Mas é isto a filosofia - e não elucubrações que visam a adesão irreflectida do ouvinte, reformulando com palavras caras os preconceitos que nos são mais queridos. Filosofar é destruir preconceitos e não perfumá-los com o bálsamo da moda.
A atitude socrática deu origem à física, à história e à musicologia, entre outras coisas, e ainda está na base destas actividades. A maior parte das pessoas não tinha grande interesse em justificar a convicção de que os objectos caem; nem em justificar a convicção de que a Terra está imóvel. Mas algumas pessoas deram-se a esse trabalho. E hoje compreendemos melhor o mundo por causa dessa atenção à justificação. O que Sócrates queria dizer é que a vida será emocionalmente mais pobre se não dermos atenção à justificação das nossas crenças mais profundas. Essa atenção liberta-nos do nosso paroquialismo emocional. Transforma-nos em cidadãos do universo.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Psicologia do desenvolvimento: o papel do meio e dos genes

No Jornal Público de 7 de Janeiro vem uma notícia insólita mas verdadeira. Nos Estados Unidos, duas gémeas, separadas muito precocemente devido a um estudo de Psicologia sobre o papel do meio e dos genes de contornos ainda não esclarecidos, reencontram-se na idade adulta quase por acaso. Apesar de serem duas pessoas completamente diferentes, partilham uma obsessão pelo cinema, àrea que ambas estudaram e em que trabalham.
Esta é uma notícia que serve também para interrogar os limites éticos das investigações em Psicologia.