quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

O CONHECIMENTO

ESTRUTURA DO ACTO DE CONHECER

1. Que tipos de conhecimento há?

Conhecimento de actividades. Por exemplo:
 Saber tocar piano.
 Saber andar de bicicleta.

Conhecimento de pessoas ou locais. Por exemplo:
 Conhecer Paris.
 Conhecer Luís Figo.

Conhecimento de proposições. Por exemplo:
 Saber que Paris é uma cidade.
 Saber que Aristóteles foi um filósofo.


2. O que é o conhecimento?

􀂄 A crença é uma condição necessária para o conhecimento.

􀂄 O conhecimento é factivo, ou seja, não se pode conhecer falsidades.

􀂄 A verdade é uma condição necessária para o conhecimento


DEFINIÇÃO TRADICIONAL DE CONHECIMENTO


S sabe que P se, e só se,

a. S acredita que P.
b. P é verdadeira.
c. Há uma justificação para S acreditar que P.

Objecções: Os contra-exemplos de Gettier. Estes mostram que podemos ter uma justificação para acreditar em algo verdadeiro sem que esse algo seja conhecimento.

3. Quais são as fontes do conhecimento?

- Um sujeito sabe que P a priori se, e só se, sabe que P pelo pensamento apenas.

- Um sujeito sabe que P a posteriori se, e só se, sabe que P através da experiência.

- Um argumento é a priori se, e só se, todas as suas premissas são a priori.

- Um argumento é a posteriori se, e só se, pelo menos uma das suas premissas for a posteriori.

- Conhecemos algo inferencialmente quando conhecemos através de argumentos ou razões.

- Conhecemos algo não inferencialmente quando conhecemos directamente (por exemplo, através dos sentidos).



ANÁLISE COMPARATIVA DE DUAS
TEORIAS EXPLICATIVAS DO CONHECIMENTO

Será que o conhecimento é possível? Este é um dos problemas centrais da epistemologia.


Os cépticos consideram que não, argumentando da seguinte maneira:

1. Se há conhecimento, as nossas crenças estão justificadas.
2. Mas as nossas crenças não estão justificadas.
3. Logo, não há conhecimento.

- Este argumento é válido e a primeira premissa é geralmente aceite como verdadeira.
- Se a segunda premissa for verdadeira, então a conclusão também terá de o ser. Nesse caso, os cépticos estão certos.

Mas por que razão dizem os cépticos que as nossas crenças não estão justificadas?

Há um argumento que os cépticos apresentam precisamente para mostrar isso. É o argumento da regressão infinita da justificação:

1. Toda a justificação se infere de outras crenças.
2. Se toda a justificação se infere de outras crenças, então dá-se uma regressão infinita.
3. Se há uma regressão infinita, as nossas crenças não estão justificadas.
4. Logo, as nossas crenças não estão justificadas.

Este argumento também é válido. Mas será sólido?


- A primeira premissa diz que justificamos umas crenças a partir de outras crenças.
- Mas se é assim, diz-se na segunda premissa, o processo de justificação não tem fim, recuando sucessivamente de umas crenças para outras.
- Nesse caso, as nossas justificações serão sempre insuficientes, sugere-se na terceira premissa.


Existirá alguma falha no argumento da regressão infinita da justificação ou os cépticos têm mesmo razão?


- Os fundacionistas (Descartes e Hume) acham que os cépticos estão errados, mas por razões opostas.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

O preconceito escondido com o inconsciente de fora…

A Psicologia Social criou algumas experiências audazes que colocam em causa a imagem e a auto-estima do ser humano. Do ser humano em geral e daqueles que nelas participaram em particular. Os investigadores, por razões experimentais óbvias, ficam habitualmente do confortável lado de fora das suas experiências. Com um teste inovador, o chamado IAT (Teste de Associação Implícita), um par de psicólogos confrontaram-se directamente com os seus preconceitos inconscientes…

Numa primeira experiência, com o objectivo de estudar as cognições implícitas, ou seja inconscientes, os investigadores criaram uma situação de teste em que se deveria responder clicando num teclado de computador com o mesmo dedo (direito) em resposta a palavras que dissessem respeito a coisas agradáveis e a nomes de flores e com a mão esquerda a palavras que dissessem respeito a coisas desagradáveis e a nomes de insectos. A tarefa era fácil. Depois inverteu-se e passou a ter de se responder com a mesma mão a insectos e coisas agradáveis e com a outra a flores e coisas desagradáveis. A tarefa fácil complicou-se, as respostas tornaram-se significativamente mais lentas. E nem a repetição acelerou as respostas…

O verdadeiro desafio, no que diz respeito aos preconceitos, começou quando se trocou os nomes de insectos e flores por nomes de brancos e negros famosos: os negros funcionavam da mesma forma que os nomes de insectos mesmo para algumas pessoas que não se julgavam preconceituosas como os psicólogos em causa.
Mahzarin Banaji, uma das psicólogas, explicou a situação dizendo: “tencionava associar branco com bom tão rapidamente como queria associar negro com bom – este era o meu objectivo consciente – mas falhava.”
O seu estudo é uma peça interessante para a compreensão dos preconceitos e da sua componente inconsciente, a que chamaram “as atitudes raciais implícitas”
O testemunho completo destes psicólogos pode ser lido aqui.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Elogio ao Amor

Serve também para lembrar em dia de S. Valentim que o Amor é sempre que o Homem quiser... 365 dias por ano e 366 em ano bissexto.
Dizem que o amor vai pelas ruas da amargura...
AMOR, essa palavra tantas vezes contada, repetida, deitada fora, cuspida, sentida, engolida em seco. Amor - fogo que arde sem se ver, amor proibido, amor louco, amor romântico, amor sexo, amor à primeira vista, amor à segunda vista... amor às vistas todas. Amor Platónico. Amor Puro. Amor Eterno.
Amor. Eu não sei o que é. Há textos geniais. Há pessoas que percebem melhor do que eu... Por isso escolhi este texto. Enquanto alguém escrever o AMOR, ele não morre.
ELOGIO AO AMOR
« Há coisas que não são para se perceberem. Esta é uma delas. Tenho uma coisa para dizer e não sei como hei-de dizê-la. Muito do que se segue pode ser, por isso, incompreensível. A culpa é minha. O que for incompreensível não é mesmo para se perceber. Não é por falta de clareza. Serei muito claro.
Eu próprio percebo pouco do que tenho para dizer. Mas tenho de dizê-lo. O que quero é fazer o elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se apaixona de verdade.
Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita amar sem uma razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática. Porque dá jeito.
Porque são colegas e estão ali mesmo ao lado. Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas e das calças e das contas da lavandaria. Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram logo em "diálogo". O amor passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se sócios. Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões. O amor transformou-se numa variante psico-sócio-bio-ecológica de camaradagem.
A paixão, que devia ser desmedida, é na medida do possível. O amor tornou-se uma questão prática. O resultado é que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade, ficam "praticamente" apaixonadas. Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do amor doente, do único amor verdadeiro que há, estou farto de conversas, farto de compreensões, farto de conveniências de serviço.
Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de hoje. Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do "tá bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides, borra-botas, matadores do romance, romanticidas. Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o desequilíbrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo?
O amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha. Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da vida, o nosso "dá lá um jeitinho sentimental". Odeio esta mania contemporânea por sopas e descanso. Odeio os novos casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice,facada, abraços, flores. O amor fechou a loja. Foi trespassada ao pessoal da pantufa e da serenidade.
Amor é amor. É essa beleza. É esse perigo. O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes. Tanto pode como não pode. Tanto faz. É uma questão de azar. O nosso amor não é para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um bocadinho de inferno aberto. O amor é uma coisa, a vida é outra. A vida às vezes mata o amor.

A "vidinha" é uma convivência assassina. O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição. Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima. O amor não se percebe. Não é para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a nossa alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe, não apanha, não larga, não compreende. O amor é uma verdade. É por isso que a ilusão é necessária. A ilusão é bonita, não faz mal. Que se invente e minta e sonhe o que quiser.
O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar, o amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe. Num momento, num olhar, o coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não esta lá quem se ama, não é ela que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se lhe tem.
Não é para perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se ter, querer e não guardar a esperança, doer sem ficar magoado, viver sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz. Não se pode ceder. Não se pode resistir. A vida é uma coisa, o amor é outra.
A vida dura a Vida inteira, o amor não. Só um minuto de amor pode durar a vida inteira. E valê-la também.»
Miguel Esteves Cardoso - Expresso